Difícil achar um símbolo de liberdade tão expressivo como o condor sobrevoando os Andes peruanos. A música “El Condor Pasa” reflete com extraordinária beleza esse símbolo, inspirada na magnificência do Império dos Incas. Embora muita gente ache que a composição é de Simon & Garfunkel, ela forma parte de uma Zarzuela peruana e foi composta por Daniel Alomía Robles em 1913. A letra original é baseada numa antiga canção de amor, escrita em quéchua. A Zarzuela também fala de liberdade. Transcorre num assentamento mineiro em Cerro de Pasco e descreve o enfrentamento de duas raças: Incas e anglo-saxônios. Tão longe esse condor voou, que a música foi incluída no repertório do "Disco de ouro da Voyager", enviado ao espaço profundo, como parte do patrimônio musical que poderia representar à humanidade num possível encontro com outras espécies. No vídeo, uma versão ao vivo do grupo CantAndino, interpretando um arranjo do grupo boliviano Los de Canata.
O difícil de entender é como essa mesma imagem pode simbolizar também a perda mais absoluta e trágica da liberdade e da dignidade que o nosso continente sofreu na década de 1970/80.
A “Operação Condor” (“Plan Cóndor”, em espanhol) foi uma organização clandestina internacional que praticou o Terrorismo de Estado, e viabilizou o assassinato e a desaparição de milhares de pessoas que se opunham, de diversas formas, às ditaduras militares na América Latina. Formaram parte dessa organização criminosa os governos de Argentina, Brasil, Chile, Paraguai, Uruguai e Bolívia sob a estrutura operacional dos EEUU através da CIA. Embora existissem muitos indícios sobre sua forma de operar, só depois de 30 anos, seus crimes começam a ser julgados e condenados, especialmente pela firme determinação do governo argentino de resgatar a memória do nosso continente, reconhecendo o valor que as palavras "Verdade" e "Justiça" têm, não apenas na retórica dos discursos.
O Brasil teve um triste destaque nesta organização. O seu papel, por seu caráter continental com múltiplas fronteiras, superou amplamente os casos mais renomeados como "O seqüestro dos uruguaios" ou a morte de João Goulart em Mercedes, na Argentina. As famílias que dominam o destino dos brasileiros há quase 500 anos resistem a qualquer forma de transparência que possa afetar seu interesses. Porém, um processo lento, do qual vai emergindo a consciência, percola o tecido social e, aos poucos, assuntos como "Anistia" e "Comissão da Verdade" começam a aparecer timidamente na agenda pública. Este assunto não compete apenas ao Brasil. A América Latina toda está expectante do que aqui acontece, já que a "Operação Condor" foi de caráter continental porque entendeu que, a América Latina unida era um perigo para o poder dominante.
Tomara que nossos governantes estejam à altura dos tempos e consigam enxergar o grande movimento pelo resgate da memória com verdade e justiça que foi iniciado em nossos países. Temos condições de avançar e uma oportunidade política única para finalmente passar a história a limpo.
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